Meus ensaios são tão ominosos ao meu “Eu” que sempre que me
encontro em uma entrevista, daquelas abruptas que não temos estômago para
digerir, fico pálido de vergonha diante das interrogações de meus conhecidos.
Sinto-me cada vez mais nu. Despir-se moralmente em público é muito mais
estressante e constrangedor do que sair pelado na rua; ao menos, na segunda
hipótese, o linchamento é instantâneo. O juízo latente me sufoca, causa fraturas
nos meus ossos e me torna pusilânime, por isso, evito cada vez mais a
aglutinação em grupo. A
misantropia é minha areia movediça de todos os dias e só há egresso da
acomodação solitária, quando sinto que meus amigos valem à pena, mas raramente
isso sucede.
Nietzsche dizia que “tudo o que se conhece perde a graça”,
Dostoievski vilipendiara a ordem: “O sentido acaba com a admiração”; dois demônios
internos que funcionam como repelentes da minha atividade social. Não posso
incorrer ao pecado da superficialidade, menos ainda ao da banalidade de um ser
mimético, comum e encontrável nas calçadas. Portanto, não force compreensão,
meu escopo não é ser analisado ou diagnosticado, antes, é dar uma brecha
sedutora para que meu leitor se afogue e fique tão vermelho e tímido quanto eu.
Sempre senti o aroma podre da nossa espécie, ele veio
acompanhado de perfumes de grife com o intuito de cortinar nossa essência
escatológica, trágica e negadora dessas duas condições. Sei que sou um
mentiroso, e mentirosos vivem no eterno desconforto de querer falar e não poder
ou do medo da descoberta. Não temos mais fogo, mas quem precisa de lenha e
querosene na época do “politicamente correto”? Não vou culpar sistemas, afinal,
me parece que o strip-tease na praça nunca foi tolerado: a repressão é coisa congênita e
peste crônica.
O marketing da transa é a roupa, isso mostra que coisas que
repousam recônditas instigam instintos primitivos no homem. Sim, imagina se
todas as pessoas andassem com os genitais de fora? Meus amigos, fazer sexo
seria como almoçar: algo conveniente, bom, normal, mas não um “segredo de
liquidificador”. O sexo masculino sabe qual é o ápice da existência, já o
feminino, devido nossa incompetência, poucas vezes o sabe.
A experiência da nudez à dois só é bela quando há intimidade,
confiança e segredos velados até então, sem esses elementos uma das partes pode
se regozijar com o fraco desempenho da outra tornando o ato vil.
Sem preservativos, nasce a prole, tanto no sexo quanto na
entrevista. Na maior parte dos casos esse filho é indesejado, por isso que em
ambas as hipóteses uso camisinha: ótimo termo para designar a roupa civil, pois
sem uma camisa, ainda que pequena, vestimos uma saia justa. Quanto chavão!
Talvez o povo tenha sua sabedoria que nunca vi.
A proteção é necessária até por questões de saúde, por isso,
conhecidos meus, saibam que estarei sempre seguro, mas sempre pronto para a
penetração. Não tenham medo, mas não chamem minha atenção por que minha carne é
sedenta. Naqueles encontros inesperados vou tentar me conter.
Essa é a beleza da literatura: não há relação mais íntima
entre seres da mesma raça. Sou promíscuo, admito! Essa semana, minha paixão é
por Jaymes Joyce. Maldita esfera masculina, menos mal que, de vez em quando,
caio nos braços da Clarice Lispector.
Quanta gente se ufana por falar a verdade! Pobres filhos de
Mefistófeles, mal sabem o teor ácido do que é real. A franqueza autêntica é uma
prerrogativa dos espíritos livres, daqueles que pairam sobre a terra e caem no
abismo dançando. É algo que não me parece uma habilidade diplomática, uma
educação inglesa ou uma roupa descolada. O homem que se arriscar a não mentir
está morto.
Essa bolha nos aparta da pele de uma mulher, da fome, do
frio, da dor, das baratas, do carro, dos remédios e da realidade. Que bolha é
essa? A folha em branco, essa que é o imã da alma. Enquanto escrevo e você lê:
pessoas nascem, morrem, transam, comem e não pensam. O mundo metafísico é uma
grande bazófia.
Vista-se, seja discreto, me mate de curiosidade, mas não use
armadura de aço.
Mulheres vulgares não são sensuais, são apenas a exposição
angustiada daquilo que querem ser e não conseguem; são exatamente iguais
pessoas eloquentes.
Só não esqueça de deixar uma gota de veneno: é nela que vou
encontrar sua essência e me embriagar tomando o resto da garrafa.
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