quarta-feira, 17 de julho de 2013

Instagram


Meus dois mais recentes textos, A Mentira Anônima e Rhythm Is Our Business, se encontraram numa esquina. O diálogo culminou num diagnóstico do nosso tempo, não geral, mas bem específico. O primeiro deles discorria sobre a legitimação de comportamento, um verdadeiro pedantismo sobre psicanálise; o segundo, falava sobre o acumulo de experiências. Mas qual o ponto fixo de encontro dessas problemáticas? Já lhes digo. Antes disso quero falar sobre sucesso, seja ele qual for.
O estupendo Fernando Pessoa desabafara em um de seus geniais poemas, não recordo o nome (sou um vagabundo intelectual) o seguinte verso: “estou cansado de semi-deuses.” Quem não está? A coisa mais insuportável do mundo é reencontrar um amigo das antigas. Geralmente, se estiver na lama, ele vai contar um monte de mentiras; e se estiver por cima da carne seca, me perdoem o clichê, vai contar a verdade. Porém, a mentira do fracassado e a verdade do bem sucedido serão as mesmas: o sucesso. O amigo que não dispor de tanta destreza assim para mentir ou para ganhar dinheiro (quase sempre o meu caso) voltará para casa, arruinado pela inveja.
Ora essa, porque as pessoas têm que sempre contar vantagens? Por isso que digo que a inveja é uma forma sadismo: mesmo sabendo que é um sofrimento, queremos que o outro a tenha por nós.
É muito desconfortável encontrar uma pessoa melhor do que você, dá vontade de matá-la, mas quase sempre construímos um discurso embasado nos defeitos morais dessa pessoa para rebaixá-la. É como aquela história: “ele tem dinheiro, mas não tem caráter”, mas quem liga pra isso? Ninguém se importa com valores éticos na hora de conseguir uma grana, mas se não conseguimos, blasfemamos quem o fez. Um outro exemplo típico da coisa, mais contemporâneo e familiar a minha geração, é o funk, mais precisamente, o chamado: “funk ostentação”. Recentemente comecei a me perguntar a razão pela qual esse estilo incomoda tanto as pessoas. Cheguei a algumas conclusões: Primeiro, quase todas as pessoas são invejosas, elas sentem inveja até pelo mais ínfimo sucesso do vizinho, imagina só por caras que aparecem em clipes com: dinheiro, carros importados, casas de praia, correntes de ouro e mulheres gostosas. Segundo, motivo já citado acima, quando se tem inveja é necessário criar um argumento, geralmente moral, contra o seu alvo. Nesse caso, argumentos é o que não faltam: a música efetivamente é uma porcaria, e muitas vezes adversa a valores cinicamente impostos, por exemplo: apologia sistemática ao crime organizado. Observação: não faço juízo de valor, portanto não pense que estou formulando criticas.


Agora sim, volto ao ponto de encontro dos meus ensaios. No meu segundo texto (Rhythm Is Our Business), dizia eu que o ser humano busca experiências extremas, acho que isso já é o bastante. No primeiro, conjeturei sobre legitimação de comportamento, mas necessariamente perante os olhos humanos. O intercurso é exatamente esse: também é preciso tornar legitima a sua experiência de intensidade. Se ninguém souber que viajei para um vilarejo no interior da Etiópia para observar o modo de vida de sua população, qual seria o sentido dessa aventura? E se eu for ao show de uma banda de rock sozinho (coisa que eu mesmo fiz no ano passado)? Não há significado, ou só há pra você, o que não é muita coisa. Mas agora a tecnologia está ao nosso favor, e, é aí que o estado de zumbi da minha geração se aflora. Não há nada que um Instagram não resolva. Eu nem sabia o que era esse diabo, mas de tanto ouvir falarem sobre, fiquei sabendo que é um troço no qual você tira fotos e as envia de forma instantânea ao seu perfil nas redes sociais. A conclusão já é evidente: você tem uma experiência, como no meu segundo texto, e a legitima, como no primeiro. Você vai à um restaurante chique com a sua namorada, em seguida posta uma foto, assim todos os seus amigos morrem de inveja.

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