quarta-feira, 17 de julho de 2013

Rhythm Is Our Business


A observação de algumas expressões vendidas no entretenimento mainstream (filmes, músicas, literatura, novela, etc.) me causou uma impressão estranha: o que é comercializável, em matéria de cultura, deve ser narrado em compassos extremamente rápidos em detrimento da busca pelo visceral, pelo conhecimento de um fato pequeno, cotidiano, aparentemente desprezível; naquele tipo de produção, mainstream, só importa o que é objetivo.
Observem as novelas, sempre o mesmo enredo: de manhã: café da manhã para discutir a relação familiar, claro; de tarde fatos importantes no desenvolvimento da trama; de noite: jantares românticos, em família ou com os sócios, às vezes um homicídio básico, coisas comuns na vida de qualquer pessoa. Nos filmes é a mesma inaudita criatividade. Na música, é introdução, andamento, refrão, andamento, refrão e fim. É uma ordem medíocre que preza pela narrativa rápida, afinal, ela é um engodo muito mais eficiente.
Como são raros cineastas como um Ugo Giorgetti, seu tempo de narração é sempre dentro de períodos curtos, nada de longas histórias de dez ou vinte anos, no máximo dez ou vinte horas, mas que revelam um olhar sempre muito perspicaz sobre as coisas, sucessos pequenos que constroem e destroem nossas vidas todos os dias. Como é instigante assistir um filme desses! Como a alma se eleva quando escuto um John Coltrane, ou um Shostakovich! Como são belos os pequenos acontecimentos cheios de espírito em Guimarães Rosa!  Mas essa é uma luta que já debutou perdida, não porque as pessoas são ignorantes e não sabem apreciar uma arte mais sofisticada, mas porque o modelo de narração da cultura de massa é insuperável, isso torna crível diante dos meus olhos, o fato de que há uma deliberação, muito inteligente, que faz com que haja consumidores para essa arte duvidosa.
A conclusão é a de que tudo deve ser abrangente e conciso, ou seja, denso, mas denso de fatos, não de qualidade. Isso é a história!
Comecei a pensar nisso quando me deparei com os filhos bastardos de Marx que berram nas ruas de São Paulo. Uma coisa admito compulsoriamente: eles estão fazendo história e a história é isso: um lixo travestido de estética. Quando lemos um livro de história, sempre pensamos em épocas efervescentes, cheias de acontecimentos a nível universal, mas se estamos presentes em um período como esses, saboreamos uma das experiências mais broxantes ao ser humano: a consciência de que tudo é banal e fútil.
Retornando à narração, os livros de história são como o entretenimento barato: narram os fatos de forma rápida e densa, para pensarmos que o ser humano sempre foi foda.
A diferença entre conhecer acontecimentos teoricamente e empiricamente, é a mesma de escutar uma partida de futebol pelo rádio e assisti-la ocularmente, seja na TV ou no campo: é uma disparidade sem régua que a meça.
Algo que já foi dito muitas vezes, mas é imprescindível repetir, é a inegável futilidade da vida: a vida é fútil, na maior parte do tempo sem graça, tributável, sem cor. A rotina não foge de nós, precisamos acordar, trabalhar, ir ao banheiro, almoçar, falar bom dia, ter hábitos. Eles, os hábitos, são a manutenção do corpo.
Nesse maldito tempo de felicidade universal, quem não coleciona experiências, entra em depressão, desperdiça a dádiva da existência. Ora, a vida tem que ser desperdiçada, como diria o Ponde: “sangramos para gerar”, isso é viver. Mas para os idiotas, viver é ir ao Playcenter, ao show do Metallica e encher a cara todo final de semana (esses são os idiotas farofeiros), ou viajar pela Europa, conhecer lugares exóticos, entrar em contato com outras culturas, quase um globo repórter (esses são os chiques), e o que os dois têm incomum é a negação sistemática de que a existência é vã, tanto que o clichê favorito deles é: “não viva em vão”. É uma busca frenética pelo intenso, aquele mesmo da narrativa do mainstream. Talvez seja esse o motivo de sucesso da arte comercial: ela faz o homem se sentir importante e capaz: capaz de mudar o mundo, de ter sensações extremas, de viver sempre inebriado pelo que é grande.
Sei lá, acho que às vezes é melhor meter a cara na bíblia. Ao menos ela me lembra que ainda sou humano, frágil como poeira e inútil como um ser que nasceu submisso a um Deus tirânico.

   

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